EUTANÁSIO, TUTANÁSIAS, ELE...
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Perdoar-me-ão o cepticismo, (ou não, que hei-de eu fazer?)... O facto é que, nos últimos dias, tenho lido, por aqui e por ali, tudo o que me aparece sobre o problema da eutanásia e a conclusão a que chego é que é demasiada areia para a minha camioneta. Se eu estivesse no lugar do Marcelo Rebelo de Sousa, desconfio que vetava a lei, qualquer que ela fosse, que a remetia de novo ao parlamento para que a pensassem duas vezes.
Notem que eu sou a favor do suicídio medicamente assistido sempre que alguém, em extremo sofrimento, não tenha sequer a autonomia para subir ao décimo andar, galgar a janela e zás! Pode, por exemplo, estar acamado, ou ser paralítico, ou ter perdido braços e pernas na explosão de uma mina anti-carro, sabe Deus... A única coisa que eu exigiria, se fosse eu o legislador, era que fosse sempre, em qualquer caso, o suicida a suicidar-se, a premir o gatilho do revólver que tenha à sua disposição; que não venha médico nenhum, enfermeira ou parente próximo disparar por ele, dar-lhe a colher de 605 forte no boca, empurrá-lo pela janela. Tudo bem que lhe arranjem uma pistola, que introduzam uma bala na câmara: mas premir o gatilho tem de ser ele, o suicida. Ninguém por ele, a seu mando, a súplica sua.
Pois, dir-se-á, e se ele estiver paralítico, por exemplo?
Bom, a tecnologia já tem resolvido problemas mais complexos. Lembrem-se, para não irmos mais longe, do Stephen Hawking, que continuou sempre a trabalhar e a escrever os seus livros apesar da completa atrofia muscular.
Resta, claro, o problema da eutanásia, que eu não entendo lá muito bem e que me causa bastos engulhos.
Comecemos pelo caso mais simples, para mim, pelo menos: imaginem que eu tenho um canito, já velhinho, com uma doença que lhe causa o maior dos sofrimentos. Que recomenda o senso comum que eu faça? Que o leve ao veterinário, o qual, se não lhe dá uma «boa morte», pelo menos acaba com o sofrimento que a ciência detecta, ao mesmo tempo que se lhe acabam os sinais vitais. Como a nossa cultura «cristã-empresarial» se recusa a admitir que os animais (mas só os outros, os não humanos, e mesmo assim...) tenham alma, os escrúpulos acabam aqui.
Diferente é o caso de uma criança. Se o meu filho bebé tiver uma doença incurável, fatal e terrivelmente dolorosa, que posso eu fazer? Tal como o canito do exemplo anterior, o bebé não tem capacidade para pedir que lhe abreviem o sofrimento, mas eu que o amo profundamente, não tenho o recurso de o levar ao veterinário... e só quem nunca esteve com uma criança que, mesmo encharcada em analgésicos, se contorce de dor e grita o seu desespero, me poderia condenar se eu assumisse a morte do meu filho e a pedisse encarecidamente... E, no entanto, é o que a sociedade, com os seus esbirros me faz. E, tanto quanto apurei, é a solução que, da eutanásia, nos quatro projectos que amanhã serão discutidos no Parlamento, unanimemente se exclui.
E pronto. Eu sei que há muito mais, mas por hoje é tudo. Sejam felizes e, se puderem, releiam o conto «O Alma-Grande» do Miguel Torga. Talvez venha a propósito, que sei eu?
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