sexta-feira, outubro 27, 2006

Fé, Esperança e Caridade
Veio o Promotor fiscal com libello criminal accusatorio contra ella que lhe foi recebido, Si et in quantum, e a Ré o contestou por suas confissões, negando sempre o pacto que tinha feito com o Demonio, e por não vir com defeza foi lançada da com que podia vir, e ratificadas, e repetidas as testemunhas da justiça na fórma de direito se lhe fez a publicação de seus ditos, conforme ao estylo do santo Officio, e por não vir contra as ditas foi também lançada d'ellas, e guardados os termos de direito, e feitas as diligencias necessarias seu feito se processou, até final conclusão, sendo a Ré no decurso da sua causa por muitas vezes admoestada e com muita caridade da parte de Christo, Senhor Nosso, abrisse os olhos da alma, e tratasse só do remedio da sua salvação, confessando inteiramente suas culpas sem ella Ré o querer fazer. E sendo o seu processo visto na mesa do Santo Officio se assentou que ella pela prova da justiça, e suas confissões estava legitimamente convencida no segundo lapso do crime de feitiçaria, e por convicta, relapsa, revogante, e impenitente foi julgada e pronunciada, e depois notificada para no auto publico da Fé ouvir sua sentença, pela qual estava relaxada á justiça secular, e advertida tratasse do que convinha ao bem, e salvação de sua alma.

quinta-feira, outubro 26, 2006

E se, em vez do Ancião da Eternidade, Deus fosse mulher?
E negra, ainda por cima?
Alguém ficava realmente perturbado?

O Sonho do Zé Fernandes
Aquele que tem mais de mil nomes, o Ser dos Seres, claro que não tem representação. Tudo o que sobre Ele se diga é demasiado pobre e, por outro lado, é excessivo. Só os Mitos tentam dizer um ou outro desses nomes. Mas requere-se um Miguel Ângelo para os mostrar no tecto de uma capela. Ou um Eça de Queiroz num romance.
Toda a gente que já leu A Cidade e as Serras (1) se lembra da invasão do 202 pela fúria bibliófila do Jacinto.
"Não se abria um armário", diz o Zé Fernandes, "sem que de dentro se despenhasse, desamparada, uma pilha de livros! Não se franzia uma cortina, sem que detrás surgisse hirta, uma ruma de livros! E imensa foi a minha indignação quando uma manhã, correndo urgentemente, de mãos nas alças, encontrei, vedada por uma tremenda colecção de estudos sociais, a porta do «water-closet!»
E num dia em que a saturação do livro é particularmente dolorosa, o Zé Fernandes sonha. Sonha que vai pelos Campos Elísios atapetados de livros, rodeados de prédios feitos de livros, cruzando pessoas cujo rosto são também livros abertos que a brisa folheia. Sobe uma escadaria monumental, também ela feita de livros e, narra o Zé Fernandes, "assim ascendi ao Paraíso".
E continua: sentado num trono de livros "o Criador lia e sorria."
"Ousei, arrepiado de sagrado horror, espreitar por cima do seu ombro corruscante. O livro era brochado e de três francos... O Eterno lia Voltaire, numa edição barata, e sorria."
De entre os mais de mil nomes do «Ansião da Eternidade», há um que eu particularmente venero: «Leitor de Voltaire».
(1) E a que não leu que comece já.

terça-feira, outubro 24, 2006

Sem título

segunda-feira, outubro 23, 2006


Mais um pirilampo.

domingo, outubro 22, 2006










O Pirilampocop e o Robotlamp.

sábado, outubro 21, 2006


Para a Ana e as suas amigas:
Estas são as primeiras versões.
Outras se seguirão, talvez o Robolampo
ou mesmo o Piricop.
Vão dando sugestões.




Eu, por ora, votaria neste. Que acham?

quarta-feira, outubro 18, 2006


O poeta de Alcácer-Quibir:

Que queres, afinal, que faça por ti? Para guerreiro, estás velho, Luís Vaz. Não tens cavalo, disseram-me que vendeste a armadura. Para comer. Passas fome? Muitas vezes?
Eu já tentei, mas não é a mesma coisa, pois não? Não conheces esta serra, há um pequenino mosteiro lá em cima, os monges capuchinhos vivem em grande parcimónia. Estive lá recolhido dois dias, tentei jejuar... não acreditas, mal souberam que era lá que eu estava, estragaram tudo. Uma caravana pelas veredas, capões e cabritos e os cozinheiros do palácio. E o meu confessor, Luís Gonçalves, com um cruxifixo e a água benta, a pensar que eu estava possesso do demónio. Pobres ermitas, há anos que não viam tanta comida, foi uma vergonha, o vinho de Carcavelos caiu-lhes na fraqueza, e imaginas, o velho abade a querer ser severo e nem se aguentava nas pernas...
Porque é que não me deixam, Luís Vaz? Porque é que o Rei não pode fazer o que quer? Nem sequer te posso nomear poeta do Reino, Vossa Magestade não deve preocupar-se com essas coisas comezinhas, já nomeámos D. Diogo Bernardes, que vem recomendado do Senhor D. Pero Carneiro, fidalgo de muito, que é preciso contentar.
Vossa Magestade tem é de presidir ao Conselho, tem é de receber a embaixada do Senhor D. João de Austria. E esta semana, temos de partir para Lisboa, Vossa Magestade não pode faltar ao solene te Deum em S. Roque... E eu só queria que me deixassem passar fome uns dias. O Rei nem isso pode ordenar?

domingo, outubro 15, 2006


Os Anjos de Alcácer-Quibir

Já te tinha visto, provavelmente lembras-te melhor do que eu. Há anos. No Paço da Ribeira, das raras vezes que por lá passei. Não gosto de Lisboa, sabes, desde que fizeram dela a capital... das pestes, da intriga, do dinheiro, dos negócios...
Sabes que ganhei ódio às moedas? Todo aquele oiro que tilinta aos nossos pés, toda aquela prata que cobre as nossas armaduras...
Mas era o dia da audiência, os candelabros estavam acesos e as filas e filas dos suplicantes brilhavam como uma Via Láctea de jóias. Que vinham eles pedir, como se fossem mendigos? Os usos tinham feito deste reino, percebes?, um reino de pedintes, de gente que suplica a esmola de um cargo, de uma tença, que ajoelhava diante de mim... Como... como se eu fosse Nosso Senhor e trouxesse no alforge uma carrada de milagres e pudesse distribuí-los assim, a meu bel prazer...
Eu caminhava com aqueles passos que me dizem representar a dignidade do Reino, o braço da minha Avó Catarina sustentava-me a inexperiência, como eu lhe sustentava os anos. E a cada instante nos detínhamos, o embaixador de meu primo Filipe, o Núncio, o meu primo Bragança, meu Tio Henrique... Em todos resplendecia o oiro, as pedras preciosas. Sabes o que é o explendor para os olhos de um menino? É o brilho que ofusca. Que cega. Quem deles era o mais luxuoso?
Só tu vestias pobremente. De negro, um velhudo baço, eras como se alguém tivesse feito um buraco no céu. Para onde dava esse buraco?
Só me atrvi a perguntar quando nos sentamos. A Avó Catarina não sabia. Foi D. Aleixo, o meu aio, quem sussurrou:
- Dizem que é poeta e que não tem onde cair de morto. Um boémio. Mas é bom guerreiro.
Foi assim que soube que tu existias.
Não é estranho que um soberano nem sequer saiba de um dos seus súbditos? E que importa se é um notável? Não achas que, Rei deste Reino, também as formigas me prestam vassalagem e que, a elas também, eu devo a protecção e guarida?
Que posso eu fazer pelos gafanhotos, pelos ratitos e pelos pardais do meu reino?
Que queres que eu faça por ti, Luís Vaz?

quinta-feira, outubro 12, 2006

Les
cigognes,
j'aimerais qu'elles
jouent avec
moi

mais Il les a placées
très haut
pour que
je n'y arrive pas.
Et donc:



Pour que je joue avec,
il m'a fait ça.
Donc:

quarta-feira, outubro 11, 2006

Ceci n'est pas une:
carrosse
bibliothèque
un fer à repasser non plus
Il faut que je gagne sans tricherie. Parce qu'on sait jamais.
Il se peut qu'il y ait quelqu'un qui tout peut et qui tout demande.
(Ceci n'est pas, mais il se pourrait qu'il le soit.)
Donc:


segunda-feira, outubro 09, 2006

O melro, d'entre a horta,
Dizia-lhe: «Bons-dias!»
E o velho padre cura
Não gostava daquelas cortesias.
Guerra Junqueiro, A velhice do Padre Eterno

sexta-feira, outubro 06, 2006

Gomes Leal, Claridades do Sul:

Mefistófles (ao longe)

O nosso bom arcebispo,
Perdeu a sobrepeliz,
Uma vez, em casa duma...
São coisas que o povo diz!