José Manuel Pedroso,
Pantaleão é nome de Capitão,
Chiado Editora, 2008
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É claro que os livros não se medem aos palmos e que não seria por ser magrinho que este deixaria de ser interessante.
É claro que os livros não se medem aos palmos e que não seria por ser magrinho que este deixaria de ser interessante.
Mas, setenta e e duas páginas para falar do exército português em tempos de guerra colonial, da província de Moçambique com os seus colonos, o seus estilos de vida, setenta e duas páginas para falar de um aristocrático militar de carreira que recebe os camaradas de armas com "pratas, cristais e Mozart", que cita Os Maias ou O Estrangeiro do Camus, setenta e duas páginas, enfim, não são nenhum exagero de prolixidade.
E mesmo assim, algumas dessas páginas ainda se perdem em coisas inúteis, como a história do corvo, picada de O despertar dos Mágicos, de Louis Pauwels e Jacques Bergier e que serve de prelúdio aos amores «até à náusea» entre o Alferes Soares e uma liberada Pitinha.
Diga-se desde já: este Pantaleão não é grande literatura, não inova na escrita, os recursos narrativos são pobrezinhos: circunstâncias merecedoras de algum fôlego são abreviadas com o recurso a relatórios, directivas, papeladas militares que só a concisão recomendaria. Os antecedentes do Capitão Pantaleão, natural de Loulé, a sua Mãe esquizofrénica e o seu Pai que bebe «copázios de aguardente de medronho ao pequeno-almoço e anda nu pelas ruas da aldeia a aterrorizar as poucas crincinhas», são despachados em menos de vinte linhas (pag. 16). E, no entanto, este Pantaleão está no cerne da intriga: serve-se do seu posto de oficial do exército para traficar diamantes e promove um massacre no interior do seu próprio aquartelamento para proteger o seu pequeno comércio.
De importante, o que este livro tem é a memória.
Primeiro, a memória de um clima, o de uma tropa colonial sem grande garbo, mais desenrascada do que patriótica, o de uma sociedade a viver a queda do império sem querer realmente saber do que se passa nas suas fronteiras.
E logo, o clima de todos os aproveitamentos em que, só dificilmente alguém escapava às mescambilhas: como se conta no livro, «um camião carregado de fardos para o Natal, tombou na estrada e o bacalhau desapareceu. "Acção terrorista da Frelimo (...), segundo o relatório." - Mas eis que todos os supermercados de Lourenço Marques a Nampula, viram as prateleiras vazias encherem-se de toneladas de bacalhau. Milagre? Nem por isso. As investigações conduziram ao saldo da conta pessoal do Major da Intendência, substancialmente aumentado."
E as investigações do Alferes Soares, dos serviços de Justiça Militar, irão conduzir-nos à rede de tráfico de diamantes sul-africanos, aos crimes do capitão Pantaleão.
Na contracapa, entre outras apreciações, encontra-se o testemunho do Alferes Miliciano de Cavalaria Carlos Vieira: "... eu estava lá, assisti e confirmo." Também ele esteve no Tete, em Moçambique, por alturas dos acontecimentos que dão corpo à narrativa. E confirma.
Que fique para memória futura.
3 comentários:
Quando «Nó cego», de Carlos Vale Ferraz,chega à 4.ª edição, dedicado, entre outros, «aos que combateram dando o melhor da juventude, generosos e confiados na justeza de uma causa que afinal não era sua», apraz-me ainda ouvir as vozes da outra juventude que conheci, que não deu mas a quem roubaram um pedaço de si, sem nenhum equívoco quanto ao crime que estava a ser cometido, de que era cúmplice forçada e vítima.Badesse
Não conheço esse tal senhor Ferraz.
Tirando algum pobre de espírito, nniguem da gente estava convencido de que iia para as colónias defender a tal de Pátria. Isso era uma coisa abstracta. Só a Diamang, a Petrangol, os óleos Cuf e a Sena Sugar States, realmente representavam a Pátria.
Uns, iam porque o pai ainda estava com ideias românticas, tipo Mouzinho de Albuquerque e Gungunhana.
Outros não tinham a coragem para mandar o pai fascista para onde ele devia ir, ou então porque tinha falhado aquela cunha infalível "que havia de livrar o rapaz".
Havia também uma imensa maioria que nem tinha feito o 2º ano - o actual 7º - às vezes nem a 4ª classe e que nem imaginavam que se podia desobedecer e desertar. Pirar-se a salto (emigrar com passaporte de coelho) com a perspectiva de nunca mais voltar, era a alternativa.
Mas os que eram amparo dos pais velhotes, os que tinham a prometida ou o emprego à espera, uma situação, por poucochinha que fosse, como é que haviam de abandonar tudo?
O bravo exército colonial foi feito desses todos.
Desses e de centenas de Majores, Capitães e Sargentos, uns lateiros, outros de carreira, muitos da Intendência, da roubalheira, de desenrascanços todos.
"A Pátria que se lixe! A mim só me faltam duzentos e trinta dias para me pirar."
E iamos riscando os dias que faltavam para tirar as botas daquela merda.
Depois, lá voltavamos com traumas, alcoolizados, com vergonha de nós mesmos, muitas vezes violentos.
As noivinhas levavam e submetiam-se.
A Pátria não quis saber da gente.
Acho que ainda hoje não quer, e já passaram 34 anos.
Anónimo:
eu entendo.
e com o que o Tacci escreve ,não me dá vontade nenhuma de ler o livro.
Já não há inocentes.
os Khmers vermelhos sabem dizer, no julgamento que está a decorrer, que obedeciam a ordens.
Quando muito há tontos!
e as épocas de guerra e de crise são um grande palco para os psicopatas.
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