Decerto a minha Gentil ouvinte se lembra de que deixámos o Carlinhos muito atrapalhado, a tentar ver se um dos desalmados Pitbuxos do Guarda se preparava para o atacar, como prevenira o Diabrete. E lembra-se decerto que o seu Primo, com o susto, ao tentar olhar, fugir e equilibrar-se ao mesmo tempo, ficou de braços e pernas à volta da trave, numa posição muito incómoda, os óculos pendurados só duma orelha. É claro que não havia nada atrás dele.
Lá em baixo, porém, o Diabrete rebolava-se a rir:
- Primeiro de Abril! – gritava ele entre gargalhadas: - Primeiro de Abril!
- Mas hoje já são dezasseis! – protestou o Carlinhos indignado.
- Isso é no calendário Gregoriano, ó mongas. – ria-se cada vez mais. - No nosso, cada vez que é feriado, é Primeiro de Abril, ficas já sabendo! – conseguiu ele dizer. - Isto, para o caso de cá ficares muito tempo, o que não acredito.
- Porquê?
A custo conseguira sentar-se de novo na trave.
- Porque és um anjolas. Acreditaste no que eu disse. E agora eu digo-te assim: eu minto sempre. Acreditas ou não?
O Carlinhos pensou.
- Não. Se mentisses sempre não me podias dizer isso porque então era verdade e tu não mentias sempre.
O Diabrete pareceu ficar amuado.
- Assim não vale. Tens mais de cinquenta e cinco de QI. E então, se for falso que eu minto sempre, qual é a verdade?
O Carlinhos conseguira desprender o sapato e descobrira um varão que descia até lá baixo.
- Sei lá! – disse ele, a apalpar o ferro que era sólido e áspero, e agarrar-se bem. – Se for falso que mentes? Então é porque dizes a verdade, não é?
- Há-há-há! – riu-se de novo o Diabrete. - Nem penses nisso. É verdade que algumas afirmações que eu faço são verdadeiras, mas isso não exclui que algumas outras sejam falsas. Não te ensinam nada na escola? Duas afirmações que se contrariam podem ser ambas verdadeiras se forem particulares, é a regra! Não sabias? Vais descer por aí? Ficas sem pele nas mãos.
Ficou.
Quando cá chegou a baixo, o Carlinhos soprava devagarinho nas mãos e olhava consternado para mais um rasgão nas calças.
- Só tens essas? – perguntou o Diabrete. – Mas ainda estão boas, senão emprestava-te estes.
- Tá-se bem. - apressou-se o Carlinhos, a olhar a sujidade dos calções - O que eu precisava era de um cão, mas um que…
- ...que jogasse xadrez e que não se importasse de ser aspirado para não largar pelos na alcatifa da tua Mãe. Já toda a gente sabe, pá. Sabes o que te digo, eu que ando aqui por este canil desde a fundação? Tu é que precisas de um dono. Um dono, tás a ouvir?
Lá em baixo, porém, o Diabrete rebolava-se a rir:
- Primeiro de Abril! – gritava ele entre gargalhadas: - Primeiro de Abril!
- Mas hoje já são dezasseis! – protestou o Carlinhos indignado.
- Isso é no calendário Gregoriano, ó mongas. – ria-se cada vez mais. - No nosso, cada vez que é feriado, é Primeiro de Abril, ficas já sabendo! – conseguiu ele dizer. - Isto, para o caso de cá ficares muito tempo, o que não acredito.
- Porquê?
A custo conseguira sentar-se de novo na trave.
- Porque és um anjolas. Acreditaste no que eu disse. E agora eu digo-te assim: eu minto sempre. Acreditas ou não?
O Carlinhos pensou.
- Não. Se mentisses sempre não me podias dizer isso porque então era verdade e tu não mentias sempre.
O Diabrete pareceu ficar amuado.
- Assim não vale. Tens mais de cinquenta e cinco de QI. E então, se for falso que eu minto sempre, qual é a verdade?
O Carlinhos conseguira desprender o sapato e descobrira um varão que descia até lá baixo.
- Sei lá! – disse ele, a apalpar o ferro que era sólido e áspero, e agarrar-se bem. – Se for falso que mentes? Então é porque dizes a verdade, não é?
- Há-há-há! – riu-se de novo o Diabrete. - Nem penses nisso. É verdade que algumas afirmações que eu faço são verdadeiras, mas isso não exclui que algumas outras sejam falsas. Não te ensinam nada na escola? Duas afirmações que se contrariam podem ser ambas verdadeiras se forem particulares, é a regra! Não sabias? Vais descer por aí? Ficas sem pele nas mãos.
Ficou.
Quando cá chegou a baixo, o Carlinhos soprava devagarinho nas mãos e olhava consternado para mais um rasgão nas calças.
- Só tens essas? – perguntou o Diabrete. – Mas ainda estão boas, senão emprestava-te estes.
- Tá-se bem. - apressou-se o Carlinhos, a olhar a sujidade dos calções - O que eu precisava era de um cão, mas um que…
- ...que jogasse xadrez e que não se importasse de ser aspirado para não largar pelos na alcatifa da tua Mãe. Já toda a gente sabe, pá. Sabes o que te digo, eu que ando aqui por este canil desde a fundação? Tu é que precisas de um dono. Um dono, tás a ouvir?
- Mas a gente não tem dono! - gritou o Carlinhos. - Os cães e os gatos e os piriquitos é que têm.
O Diabrete largou de novo a rir.
- Man, és um puto bué da palhaço!
- Man, és um puto bué da palhaço!
Pôs-se de pé, a custo, e depois olhou para o Carlinhos com um ar feroz:
- Não viste o letreiro acolá na porta, quando entraste?
- Vi. Proíbida a entrada a pessoas estranhas ao serviço. Mas eu não tive a culpa, foi a garina de lá de fora que me mandou entrar, eu só queria um cão que jogasse xadrez e não se importasse de ser aspirado para não largar pelos na alcatifa...
- Já sei, já sei. - disse o Diabrete resignado. - Mas não era esse aviso, que eu esse nunca vi. Era o outro, grande, por cima da porta: Lasciate ogni speranza, voi ch'entrate! É uma frase bonita, do Dante. Ou do Horácio ou de um desses indianos que fazem picanha enlatada. Nunca comeste?
- Não. O que é quer dizer essa coisa?
- Qual?
- Essa do laxata do tóni ganza...
- Quer dizer que aqui é tudo ao contrário. Aqui, quem manda é o Guarda. Logo depois, quando ele não está, somos a gente, o Senhor Deus e nós. Depois são os cães. Depois os gatos e as tartarugas. Os peixes, e os pássaros, esses atiram-se logo para o caldeirão da comida. E depois é que vêm os Pitebuxos e no finzinho de tudo são vocês, as pulgas e as carraças. Tudo aquilo que havia de haver um remédio como o DDT. Tás a ver, ó meu? Aqui tens de ter um dono, senão, comem-te vivo. Pás! É a ordem da Criação.
O Carlinhos não disse nada.
Amuado, seguuiu atrás do Diabrete que inspecionava as jaulas uma a uma, resmungando. Depois parou e a baixou-se.
- Sim, podes ser tu. Já não és muito nova, mas ainda serves.Virou-se para o Carlinhos.
- Dou-te a esta aqui, e vais com sorte, que nunca foste de um cão mais baril. E ai de ti! Ouviste, ai de ti se não te portares bem e não a tratares como merece!
Com o dedo grande do pé abriu o trinco.
A Magrizela, com um ar estonteado assomou à porta.
- Que é tu queres, hem? Hoje não há direito a um bocadinho de sossego? – perguntou ela.
Com o dedo grande do pé abriu o trinco.
A Magrizela, com um ar estonteado assomou à porta.
- Que é tu queres, hem? Hoje não há direito a um bocadinho de sossego? – perguntou ela.
Mas, atentando melhor na sua fraca vista, reparou:
– Oh, és tu, ó sedutor?
- Não – respondeu o Carlinhos. – Sou só eu.
- Não – respondeu o Carlinhos. – Sou só eu.
E pronto!
Leiam, Gentil Senhorinha e Nobres Damas, a continuação destas prodigiosas aventuras, já amanhã, depois ou noutro dia que calhar, quando e o Pai do Céu permitir e me dêem uma abébia aqui em Rilhafoles, onde às vezes me deixam usar o computador se eu não estiver muito descompensado - dizem eles.
7 comentários:
O primo carlinhos deve estar a pensar como há-de aparecer com uma magrizela em casa...embora as magrizelas custem menos a aspirar
Gostei muito, muito e depois?
O "e depois"?
Não sei lá muito bem. Talvez o Carlinhos mude de nome e a Magrizela, ao receber um beijo dado por ele, se transforme... Em quê, ainda não sei, mas pinta-me que em princesa não vai ser.
Talvez num carro de corridas que deita muito fumo.
Um abraço, Anita.
Só espero que em Rilhafoles o tratem muito bem para continuarmos a ler som um sorisso de orelha a orelha. Não percebo o tom depreiativo da frase "vivemos num mundo cão", este muundo até me parece "buédacurtido" :)
Beijinho Tacci, Já estou como a Ana, gosto. Gosto muito :)
LOL! (acrónimo comummente usado entre a nova geração cibernáutica para "laughing out loud", que se poderia humildemente traduzir como "estou a rir para caramba")
Gi, em Rilhafoles eles são muito compreensivos. O que têm é falta de verba o que, de há anos a esta parte, é um mal que ataca o nosso pobre país. Creio que o mundo cão(dos cães) não é muito mais fácil do que o nosso. Mas o Carlinhos, espero, lá se há-de entender.
Um beijinho, Gi.
Olá, Gilgamesh.
Há que tempos não aparecia por aqui. Fico satisfeito por saber que se ri tâo alto e espero que continui a divertir-se com a história do Carlinhos.
Um abraço.
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